domingo, 28 de dezembro de 2008

DESALINHO


Eu entro fácil no jogo. Eu quero entrar. Esse jogo de gato e rato, de paixão e lasciva, de sexo e posse. “Sem posse, por favor... “ eu te imploro e você me domina. Eu me deixo dominar, me entrego lutando um pouquinho para dar mais graça. Eu quero isso, quero paixão, quero você me desprezando e eu fazendo seu jogo. Quero desprezar você e te fazer de capacho. Quero brincar com teu ego, massagear, irritar, tirar e colocar. Quero doer, fazer doer. Quero chorar e fazer chorar. Quero você nos meus pés enquanto eu me levanto dos teus.
Mas quando você me olha nos olhos (ah, quando você me olha nos olhos...), daquele jeito quente e molhado ao mesmo tempo, daquele jeito só teu, que me desnuda, me afaga, me trás para dentro de teu corpo.. não tenho nada de posse, nem de domínio, nem de dores... só tenho consciência que nada pode ser tão claro para quem tem paixão.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

INDEFESA


Ele me olha dentro dos olhos, tão fundo que chega ao estomago. Eu retribuo cinicamente. Sinto calafrios quando ele me penetra com seu olhar, mas me mantenho firme, enfrentando sua força tão improvável.
Ele tem uma magnitude nas mãos que me entorpece. Quando estou perto fico tremula e não disfarço. Para que? Não tenho medos, tenho desejos, tenho portas abertas, tenho possibilidades e tantas e tantas vontades que basta fechar os olhos e me permitir.
Eu o quero por perto. Dentro de mim, com os olhos, as mãos, o que puder estar por dentro. Quero sua alma bem próxima a minha. Eu o quero. Como se quer um presente, um sonho, um doce. Quero seu corpo, seu sorriso, seu olhar fixo nos meus e se esquivando um pouco, não por medo, mas por charme. Um charme inospio, um quê de criança e homem além de tudo o que se respira.
Além, quero ele além de mim, lá longe de onde já foram. Quero ele mais que tudo o que passou. Quero tanto que nem sei dizer o que é isso, nem sei dizer o que me suspira, o que me extasia, o que me prende a tanto.
Ele me olha tanto, de todos os jeitos, em todos os sentidos, até de olhos fechados. Me caça, sente meu cheiro e me provoca. Me possui como um bicho, me puxa pelo cabelo, me devora. Me detém como um cárcere de desejo e macula.
Eu soluço, tremo, esperneio, envaideço, amoleço. E não quero fugir.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

O QUE FOI EM VÃO


Uma hora eu derramo lágrimas de saudades de um. Noutra eu suspiro pelo segundo. E mais adiante, sonho com o terceiro. Que parte de mim se derramou? Amarga solidão de corpos estáveis, que me fez essa criatura enfadonha com meus vestidos rodados e minhas rebeldias sem causas. Eu paro em alguns momentos e peço uma escolha. Mas meu coração não se rende a uma opção. Cada um no seu espaço, com sua esperança, seus delírios. Cada um distante de mim, para eu poder sonhar, suspirar, chorar de saudades. Cada um me faz ser essa louca solitária, uma loba uivando para a lua almejando um passado que, como se diz, já passou.
Não sei dizer se me escrevo nestas lembranças ou se elas existem porque não foram terminadas como eu queria, como deveriam ser finalizadas histórias de amor. Do tipo que se diz adeus, se explica que o coração partiu, que o amor acabou ou se transformou, que talvez não seja a hora certa, mas que foi bom enquanto durou. Não. Todos eles se foram repletos de amor e se perderam na bruma. Deixaram rastros pelo caminho, deixaram hipóteses, deixaram pedaços de si e levaram pedaços meus. E não houve devolução porque não deu tempo.
Não há tempo para despedidas quando se ama demais. Nem dá tempo para rearrumar as malas da partida. Vai com a roupa do corpo, desalinhado mesmo, até enxarcado pelas lágrimas. Vai como quem esta perdendo o trem, correndo desesperado atrás, sem ter sequer o bilhete nas mãos.
Eu penso em um, dois, três e posso pensar num quarto se assim couber. Não posso é ficar sem pensar, sem sentir saudades, sem suspirar em rever um amor. Não posso ficar sozinha com meu corpo e minha alma. Não posso achar que tudo foi em vão, porque senão estarei fadada a acreditar que minha própria vida foi em vão.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

EU MESMA NO ESPELHO


Eu falo sozinha, caminho pela areia e deixo a onda molhar meus pés.
Sou egoísta, ingênua e nem sempre penso no amanhã.
Gosto de escrever quase tanto quanto falar.
Escrevo poesias e histórias minhas e dos outros.
Tenho medo de barata.
Odeio vomitar e depender de alguém para andar.
Sou exagerada e tudo para mim é para sempre, até passar.
E quase tudo passa... dores, felicidade, dúvida, raiva, mediocridade, caprichos.
Amor não.
As lembranças são para sempre. Como o amor.
Meus olhos são intrigantes. Meu cabelo é longo. Meu cheiro, natural. Meus pés estão lanhados. Minhas unhas das mãos são cumpridas e vermelhas. Meus dentes afiados. Meu sorriso cativante. Minhas lágrimas comoventes.
Sou compulsiva e fico sem ar enquanto não terminar alguma coisa. Até mesmo uma frase.
Às vezes sufoco quem amo. Mas isso passa também e tudo vira mera ansiedade.
Tenho uma filha, que é a minha melhor parte e ás vezes invertemos os papeis.
Nada para mim é tão definitivo quando amar. E tenho a estranha mania de amar tudo que toca meu coração.
Coleciono amigos verdadeiros e não deixo pegar mofo. Tenho
acumulado alegria de viver.
Grito alto demais quando estou com raiva e choro dias inteiros até sarar.
Tento ser invisivel, mas não dá.
Fico inebriada com o fogo e minha temperatura é sempre febril.
Preciso de música quase tanto como o ar.
Nenhuma poesia me chocou tanto como ouvir "eu te amo".
Não tenho hora de voltar ou ir embora. Às vezes perco o ônibus.
Gosto de doces, empada, lazanha e champanhe. E também de dirigir em alta velocidade.
Adoro andar descalça e não tenho jeito para sentar.
Tenho todos os medos do mundo mas pulo do penhasco mais alto para tentar voar.
Ah, como é bom ser livre!
Meu joelho tem cicatrizes, como meu coração também.
E daí?
A falta de tempo é sempre uma desculpa dos que não sabem viver....
Não tenho relógios. Para que?
Subo na montanha russa em pé até ficar inebriantemente tonta.
Sou ímpar, singular, inclassificavel.
E ninguém me impede de sonhar.
Eu escrevo minhas histórias. E você?

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

MENINO BONITO



Eu nunca fui muito de gostar de homem moreno, mas também não sou de me definir em estilos. Gosto de gente, morena, branca, negra, alta, baixa, gorda, magra, nova ou velha. Mas esse menino é moreno e tem um sorriso pra lá de contagiante. Ele tem também cara de sério, roupa de sério e de sério só tem a meninice. Eu, que nunca gostei de cara muito sério, não me enganei. Ele me faz rir com seu jeito às vezes desajeitado de ser ele mesmo. Tem um jeito carinhoso e querido, que conquista homens e mulheres. E comete tantas loucuras que me dá medo! E também um tesão enorme!
É bom estar do seu lado, ou apenas por perto, mesmo com tão pouco tempo que o conheci. Por segundos, parecem meses. E os meses parecem instantes. Sua presença é tão sólida em nossos parcos encontros, entre coxas e bocas, as nossas e de terceiros, que fico muito curiosa diante deste fato. Ele fugaz, muda o tempo todo, não lembra o que fez e nem sabe o que fará. Ele é carente, quer todas, quer muitas, nem sabe bem o que quer. Ele é uma roda gigante, uma montanha russa, um funk misturado com samba de roda. Ele é uma multiplicidade. Tem hora que desaparece feito foguete e deixa pelo caminho seus rastros de fogo. Algumas vezes eu morro de ciúmes, um ciúme esquisito porque nunca fui dada a ciúmes de qualquer espécie. Mas a maior parte das vezes eu morro é de rir.
Ele é muito diferente de mim, mas de um jeito que não sei explicar, nos entendemos muito bem. Nas poucas vezes que paro para pensar na lógica desse encontro, eu me sinto uma estranha no seu mundo ordeiro e correto e no seu mundo de loucuras e êxtases.
Ah, mas ele é uma multiplicidade...Deve ser por isso que ele me intriga tanto, porque na verdade é igual a mim e isso dá curto circuito.
A gente nem se conhece direito, mas eu aprendi o nome de sua mãe dia desses e isso me concedeu uma certa intimidade. Às vezes ele pergunta sobre minha filha e eu fico com medo de parecer apenas uma mãezinha dentro do seu mundo tão peculiar. Eu procuro chamá-lo pelo apelido, talvez para manter uma certa distancia do mundo real que nos cerca. Mas eu acho que ele nunca foi da outra superfície que nos conhecemos, porque de um jeito que não sei explicar, ele é tão real que não o reconheço em outras estadas.
Eu não sei se vamos nos conhecer de verdade, nem sei se vamos nos encontrar de novo, se vamos nos beijar e se voltaremos juntos para casa na próxima festa. Nem sei se vai me fazer rir ou vai me dar prazer. Não entendo o ciúme e essa amizade que dá tanto beijo na boca e uma vontade eventual de fazer sexo. Não entendo porque eu não quero nada com ele mas porque me dá uma moleza no coração quando olho nos seus olhos carinhosos. Não sei de muita coisa sobre ele, talvez um pedaço do que me mostra, que às vezes é muita coisa, às vezes é quase nada e nem sei se quero saber. Às vezes eu quero falar com ele o que sou para ver se eu entendo o que ele é.
Eu sempre fui uma pessoa racional, sempre tive explicação para tudo e para ele não sei dizer qualquer palavra que faça mais sentido.
Talvez diga apenas que ele me desperta, me anima, me atiça, me impregna de gás.
Talvez eu tenha certeza que essa falta de explicação seja recíproca.
Talvez o melhor desse encontro é não saber de nada e muito menos esperar alguma coisa dele.
Menino moreno, como é bom viver sem ter que esperar alguma coisa de alguém... Uma ligação, recados gentis, promessas fáceis, encontros pré-determinados, angustias de sentimentos confusos, a melhor forma de agir, o melhor sorriso, a cruzada de pernas perfeita, o olhar caprichado, a concorrência...
Eu só olho nos olhos dele e pronto! Posso ser o que sou!!
E quando a estrada da vida faz a gente tropeçar um no outro, eu posso me permitir esperar que seja apenas meu amigo naquele momento e talvez na eternidade que nós pertence durante o tempo que estamos próximos.
Eu falo tanto que lhe falta juízo... falta não... ele é um aventureiro, uma criança aventureira querendo descobrir o mundo e o seu próprio mundo. Talvez seja por isso que gosto tanto dele, porque ele não tem limites.
Esse moreno é bonito e é bom saber que seu sorriso estará sempre presente em minhas mais doces lembranças.
E que esse sorriso fica melhor quando está junto do meu.

DESVIRO


Quando eu mudo, mudo de verdade, não tenho meio termos nem frescuras, vou no âmago, no fundo do poço, chego a pensar que não vou sobreviver. Poderia me intitular fênix, mas não vejo mitos, apenas uma dolorida verdade. Porque mudar dói e muitas vezes deixa cicatrizes.
Mudança não é apenas alterar a cor dos cabelos e corta-los, trocar o lugar dos móveis, modificar a cor das roupas que usa e até os seus estilos. Dizem que para mudar é só começar com os pequenos hábitos, as pequenas rotinas. Não acredito. Mudar é de dentro para fora, uma conversa constante com seu alter ego e os encontros com sua própria alma deslavada.
Eu repito muitos erros cometidos e tenho uma dificuldade enorme de mudar essa repetição, mas vou mudando aos poucos. Não basta eu mudar de lado ou virar a cabeça de um jeito diferente.
Assim como não acredito em mudar a nossa própria natureza para credenciar as pessoas uma máscara que não é a nossa.
Estou na fase das “não máscaras”. Não quero mais me disfarçar de codinomes, figuras de linguagem e ficção para ser quem eu sou de fato. Alias, nunca gostei disso, mas às vezes a gente acaba sendo levada pelas condições apresentadas pela sociedade. Não quero ser o que não sou, não quero ser insuportavelmente o que não sou. A pessoa que olho no espelho é a aquela que vai se modificando com os anos e as histórias, mas ainda assim é a mesma pessoa.
Eu me arrependo de coisas que fiz, de palavras que disse e das que não disse, de impulsos, ansiedades e até de parecer ser o que não sou. Me arrependo de coisas que não fiz, de momentos que perdi, dos medos, das travas, dos “eu te amo” que ficaram presos na garganta. Mas não me arrependo de ter sido o que sou, de ser quem sou, de ter vivido tudo o que vivi.
Minha vida é um movimento constante, uma roda que gira o tempo inteiro e as vezes me dá enjôos. Conheci coisas boas e ruins, pessoas que valeram a pena e outras que não se devem lembrar, músicas lindas e inesquecíveis, livros chatos, livros mágicos, lugares incríveis, sensações espetaculares. Nem sei se vou viver muito mais ou se meu espaço será breve. Mas sei que minha vida é uma mudança eterna. E na verdade, sempre sou eu.

GOSTO NÃO SE DISCUTE


Gosto não se discute, mas mal gosto se comenta. Mas o que é o mal gosto para quem é diferente de nós?
Meu ex-namorado sai cada dia com uma mulher diferente. E todas elas são bem diferentes de mim. Então, ou eu estava deslocada de seus gostos pessoais, ou ele está realmente querendo se desvencilhar de alguém que pareça comigo.
Ah, para encher meu ego eu poderia dizer que ele está tentando me esquecer de qualquer forma, como é prática dos homens, porque segundo o livro da guerra, a melhor defesa é o ataque. Afinal, quantas mulheres como eu ele pode encontrar no mundo? E até onde minhas imperfeições são tão ruins para sua rotina? É tão bom pensar dessa forma, mas o desconforto disso pode ser maior que o prazer de se sentir amada pelas vias tortas. Porque amor não vivido é drama e isso é pior que mal gosto.
Mas ele está escrevendo poemas, textos, músicas para elas... então todas são iguais a mim? Até onde se faz tudo igual e onde as pessoas não são iguais em nossa vida?
Ele tem uma delas, que chama de “gatta”, cuja sua impressão de desejo o cega de tal forma que ele não percebe o quanto é ridículo. Acredita que a tal “gatta” é a visão do paraíso e que todos os homens a vêem como ele próprio. E a pobre mulher estranha é apenas alvo de risos fáceis e de um leve deboche de sua figura oriunda dos discos de vinil dos anos 60, vide Janis Joplin em tempos de guerra.
Será carência afetiva e necessidade de aceitação?Seus olhos tão sensíveis me remetem a quere-lo bem, mesmo dentro de outras histórias normais, tristes, divertidas ou esdruxulas.
Joguei minha carência debaixo do colchão, porque não quero mais ser capaz de errar tanto. Prefiro continuar aprendendo a vida de outra forma e me relacionando com as pessoas que podem me acrescentar realmente algo além de uma diversão imaginária.
E sem ego, a vida continua e vamos por ai pegando as pedrinhas no caminho para jogar para o alto como brincadeira de criança. As vezes a gente derruba, cata de novo, cai e deixamos para lá. Assim é a vida. Pedrinhas que vamos catando nas estradas de nosso caminho. Algumas pedras mais especiais a gente coloca no bolso para guardar, mas só as preciosas duram para sempre em nossa lembrança.
Mas como reconhecer “a” pedra especial?

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

TRANSPORTE


Catarse:sf (gr kátharsis) 1 Purgação. 2 Purificação. 3 Psicol e Med Método de purificação mental que consiste em revocar à consciência os estados afetivos recalcados, para aliviar o doente dos desarranjos físicos e mentais oriundos do recalcamento.
Tudo o que fazemos será uma catarse? Será que cada linha de texto, poesia, frase, não esconde em si uma pseudo-explicação para a loucura que paira em nosso interno?
Meu nome é catarse. Vivo em constante desvio de rota para expurgar sentimentos daninhos que possam, remotamente, abduzir minha alma. Falo de amor, de dor, de erros, de acertos, de sentimentos contidos, de sentimentos extrapolados, de raivas, confusões, dramas, risos, gargalhadas até. Falo de mim. Uma mistura inconseqüentemente divina de tudo o que é emoção da face da terra. E do universo, talvez.
Talvez, só talvez, eu possa dizer que num momento me desvencilhei das catarses e aprimorei meu senso critico. Mas será que até mesmo nele não estava minha purgação? Falar de política, amigos, cotidiano, amores, beleza... Cada qual contém em si sua forma de transmutação. Um pedaço cru da gente, inserido no preenchimento das letras escritas e faladas. Até quando se rebusca a fala, quando se mente na escrita, ali está o que somos. O que sou de fato.
Vamos assumir nossos dramas! Porque não expurgar o tempo todo o que temos de ruim e rejuvelhecer?
Cada silencio, palavra dita e escrita, cada remoto movimento está lá nossa forma de mudança, nossa necessidade de ser outra pessoa, melhor, diferente, menos enjoada, menos conflitante, menos de menos... muito mais, como se não fossemos muita coisa. A busca do personagem perfeito, sem entender que somos todos eles, um pouco de cada um que criamos para nos esconder de si mesmos.
Eu não sei na verdade quem eu sou... ou será que temos medo é de admitir isso?
Eu não tenho não... eu faço catarses...

Eu não sei quase nada do mar


Sou intensa e assusto, mas não mordo ninguém, a não ser de levinho, que nem dá para machucar... É fácil se assustar com alguém que não tem medo de ser o que é, nem de assumir os próprios erros. É cômodo se assustar com quem vive apaixonada por si mesmo e pelo amor, pelo que ele é de fato. Sou como sou, e acima de tudo, uma artista visionária. A arte de viver é meu maior talento e assim aperfeiçoou minha técnica de sobrevivência.
Intensa...Alguém pode me apresentar um autentico poeta que sabe escrever sem viver os amores e dramas, como rimam os versos? Sou uma escritora, que olha para o mundo com olhos curiosos. Ah, que redundância dizer intensa... a vida só pode ser vivida assim.
Sou uma mulher que não sabe viver de mentiras e se expõe demais. Quando quero é por inteiro, quando vou embora, é para sempre.
Não sei explicar meus gestos e motivos: não quero e não preciso. Só quero ser feliz, em cada detalhe do meu tempo, em cada forma dos meus sonhos. E sou. Alegre demais, triste demais, tudo quando tem que ser, tudo ao mesmo tempo e com a força indissolúvel que teima dentro de mim.
Talvez eu seja um exemplo de fé, sobretudo nas horas que acredito que Deus existe. Então removo montanhas e estilhados cravados em almas sedentas de contenção.
Quero estar ao lado dos artistas da vida, dos sonhadores, dos lunáticos, dos iguais, daqueles que são complexos demais para se entregarem as mesmices e falcatruas dos moralistas, da felicidade fácil da ignorância, da hipocrisia dos ranços. Quero aqueles que sabem que complicar a vida é só atrasar a simplicidade que os sábios escolheram para viver.
Quero amar e ser amada pelo imperfeito, o homem torto, o amor certo do incerto.
Quero ser o vento em suas nuances, o mar em seus mistérios e as palavras piegas dos apaixonados.
Sou poesia que nem sempre rima, sou história de livro de sebo, cordel do fogo encantado, musica de todos os sons, sentimento no osso.
Uma possibilidade.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

AQUI JAZZ


Solenemente informo: acabou. Ontem te enterrei, finalmente, sem as mãos postas para fora. Rezei uma oração para sua alma, derrubei umas lágrimas do passado e pensei em tudo de bom que você deixou no legado de minha história. Mas então você se foi.
Ouvi nossa canção pelo rádio e senti uma homenagem póstuma. Lembrei suas palavras antigas, li suas poesias, vi suas fotos e num gesto de nostalgia, peguei um bilhete de teatro do primeiro passeio que fizemos. Anotei seus códigos e os meus, refiz nosso percurso e observei nossos sonhos. Guardei tudo numa caixa simples e bela. Até mesmo um livro de poesias de Pessoa. Enterrei junto de você.
Fim. O fim poderia ter sido antes, mas era cedo demais para que eu entendesse. Eu queria mais, sempre quis, sempre quis além de tudo o que sempre tive. Estou toda arranhada, permiti. Deixei meu coração ficar bem esfarrapado, mas ainda dá para costurar. Aprendi a dar pontos de bordado e posso reescrever nele as palavras e histórias perdidas em você.
Mas uma hora os aparelhos são desligados e aquele fiapo de esperança se torna apenas memória. Não cabe mais decepção, nem implorar uma chance de consertar o que se fez de errado, nem voltar ao tempo e pisar no caminho certo e pré-escrito. Não há perdão. Só a morte. O fim, o fiapo de coração desalinhado e a secura dos olhos cansados de chorar e agora tão obliquos.
De frente para o vento, deixando ele bater e levar teu pó.
“Voa com as lembranças”.
Agora só resta colar mais essa página do meu livro de memórias, porque história de amor não se consegue arrancar as páginas.
Só não sei como se tira da pele o teu cheiro. Nem com esponja, nem com sal. Nem com soluções.

SEM FÔLEGO


Bati tanto com a cabeça que rasgou um pedaço da pele. O fiapo de sangue já começa a escorrer e incomoda minha visão. Antes disso, meus olhos já embaçavam. Estou tão tonta que erro até os passos mais simples. Nem consigo mais esbravejar. Mas o que irrita é o arfante nó no peito, o embrulho no estomago e a vontade de não existir.
Errei.
Precisava ser normal, ter uma vida norma, pensar normal. Esse sufoco já bastou, agora transborda. Que pecado cometi? Dura e queimada nas artimanhas do inferno, estou de joelhos entregue a culpa.
Bicho suicida. Eu sou um bicho suicida. Quero pular do alto do prédio mais alto. Quero flanar pelas suas janelas abertas e sorrir para as pessoas normais, na hora que escovam os dentes, quem esmurram as crianças, que almoçam, que jogam cinzas de cigarro no carpete, que limpam as mãos sujas de doce na roupa, que falam dos outros vizinhos, que tem dor de barriga e, mesmo reclamando entre os corredores sobre o emprego abominável, o colega falso, o homem ignorante e a mulher frigida: sorriem.
Deve ser por isso que minha cabeça está cortada, meu estomago ardendo, minha vida desgovernada no enguiço dos meus atropelos. Eu preciso sorrir, apenas sorrir. Assim, passa, disfarça, parece menor.
Não estou vendo mais nada. Tem sol na fresta aberta da porta. Mas meus dentes se destacam na luminosidade.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

QUASE NADA


Queria dizer que você é brocha, sem sal, tem verrugas pelo corpo e manias estranhas. Mas não posso. O sexo com você é amor, o prazer, um nirvana e seu corpo é aderente a minha alma.
Mas grito que você é covarde, por expurgar meu nome de sua história como se pudesse apagar cicatrizes.
Covarde de amor, tanto amor, que sente por mim e não me olha nos olhos para dizer que não sabe mentir. Ai que vontade de morrer! Para não ver mais seu desespero esdrúxulo em me tirar do seu coração.
Chove torrencialmente e minha rua alagou. A luz piscou e deve acabar a qualquer momento. Estou com frio e tremo. Mas no fundo da janela, dá para ver o arco íris. Ele tem a cor do nosso amor.
Agente já se beijou sem suspirar? E alguma vez teus olhos olharam em direção oposta aos meus? Doce amor que mantém a tradição de dramas de amores maiores. Por serem maiores, talvez. Eu vou caminhar sem você e sei que seus pés se movem sem mim. Sei também que haverá outras tantas bocas e possíveis novos dramas. E muitos sonhos à frente. Mas do teu lado aprendi a andar sobre o mar. Aprendi que o sabor de tua boca é mais doce que o mel e que nossos sonhos sonhados juntos são realidade. Aprendi que tudo que vivi antes de você foi mero ensaio de como te amar melhor. Aprendi como ser sua sem que seja meu dono.
Que dupla somos nós, melhor que queijo com goiabada. Melhor que sonhar acordada, que rabanada no natal, que viajar de barco, que ouvir cartola.
Você não tocará mais nenhuma nota no seu violão sem lembrar das vezes que tocou para mim. Nem fará mais composições de amor sem que meu nome não esteja nas entrelinhas. Não lerá mais um poema sem lembrar dos meus versos, nem andará pela areia da praia sem olhar as pegadas que não dei do teu lado.
Não existe dor maior que o fim. Mas a do fim que não termina no fim.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

"Gosto mais do mundo quando posso olhar para ele com você". O amor é inebriante, cria funções em nosso corpo e também tira, num clique do coração. Nem tem como explicar, mas para quê?
Amor, essa palavra que dá nausea, prazer, lágrima, risos, tremedeiras, irritações, carencias, medos, segurança, força, meiguice, delirio, tontura, secura, calor...
Amor... que coisa louca...

domingo, 16 de novembro de 2008

SÓ PARA VOCÊ


Tem um som de flauta tocando lá fora. Corro para a janela. Um garoto uniformizado toca sentado no banco da rua. Flauta doce. Não era a surpresa que queria não, mas fico enternecida eu ouvir suas notas. Ele toca bem, suas canções soam belas. Seus dedos são brancos, mãos cumpridas e doces, como a própria flauta. Me remeto aos tempos que te ouvia tocar, com mãos tremulas, de dedos cumpridos e doces, de músicas profundas. Tempos idos que me causam surpresa. Tempos de saudade ou só lembranças que se partiram no meio.
Perco um suspiro no vento, podia ser um soluço. Não permito mais choros de amores que não aconteceram, não decolaram, ficaram pela metade. Desvio de dramas. Escuto só a canção, lembro do teu rosto infantil e o quanto de ternura que me infunde. Isso basta, é suficiente. Lembrar é o que me importa nesse momento.
Deixo escapar um sorriso. Acho que alguém vai leva-lo até você para que entendas o quanto te amo e o quanto o amor pode ser maior que o amor.

sábado, 15 de novembro de 2008

INICO DE CONVERSA


Solidão não é coisa de gênio, nem de miserável, nem de carente. Solidão todo mundo tem um dia, mesmo que rapidinho. Às vezes ela bate e volta, mas algumas vezes ela consegui driblar os anticorpos e se instala.
Meu dente está doendo. Estou me sentindo sozinha demais para caber nesse edredom.
O dia hoje está muito esquisito, chove, faz sol, tem calor de molhar a calcinha e bate um vento frio que dói a garganta. Como eu, ele vai e volta. Como meu coração, ele não sabe o que fazer e vai derrubando tudo a sua volta.
Meu dente dói, minha garganta dói, meus pés doem.
Um médium me disse que dor nas pernas e na coluna é medo de mudança. Também ouvi dizer que arrumar guarda-roupa e objetos é uma forma de arrumar o intimo. Meus pés doem que chegam a tilintar. E estou sem a menor paciência para arrumar alguma coisa.
Já tive coleção de cds, de livros, de discos de vinil, de borrachas, de papeis de carta, de álbum de figurinhas, de chapéus, de chaveiros, de canetas, de lápis... vendi tudo e doei o que sobrou. Confesso que a venda do primeiro cd me fez cair em lágrimas, mas depois tudo foi indo embora com muita facilidade. Numa ação desesperada de necessidade, consegui dar um passo maior dentro de mim. Sempre me apeguei muito a objetos e coisas sem vida, como se falassem comigo e me amassem. São meros objetos inanimados os quais me dedicavam por algum tempo em minha vida.
Para que tanta roupa, louça, adereços? Lindos, belos e passageiros... não me importa mais se amanhã eu tiver que ir morar em outra cidade e refazer meus queridos objetos. Porque os papeis se vão, as roupas se acabam, mas as lembranças não. O diário portátil que carrego no meu cérebro, cabe todas as lembranças e acontecimentos e não permite nem aquela memória seletiva de captar somente as coisas mais intensas. Ta tudo lá! Cheiro, visão, sons, sensações, gostos, sonhos, angustias, amores, raivas...E o melhor, ninguém pode tirar isso de mim.
A porta da solidão, as coleções... os apegos. Tudo tão atrelado a nada, ao vazio que cultivamos. Até a dor de dente que vou curtindo até esquecer que é o dente que dói e não o coração. Dizem que os cegos vêem tudo preto porque vêem mais. Será que eles se sentem solitários ou tudo é uma questão de perspectiva?
Hoje me desfaço facilmente de objetos os quais não nutro mais sentimentos de amor e apego, mas cada vez é mais difícil me separar dos afetos. Esses sim, são aderentes a alma.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

como papel de pão


Amigo é coisa para se guardar no lado esquerdo do peito... já dizia o nobre amigo Milton nascimento. E o nome “amigo” ficou tão lugar comum quanto a palavra “amor”. Talvez por serem muito próximos e semelhantes, esses sentimentos se perdem na vulgaridade do cotidiano e todo mundo é amigo de infância, mesmo tendo conhecido o “irmão” há poucos minutos.
Assim como o amor, a amizade não precisa necessariamente de anos para se instalar e ser verdadeira, mas com certeza, de um tempinho para se conhecer e fortalecer o próprio sentimento.
Todo mundo é amigo de botequim, que ri, que chora, que joga conversa fora no meio de chopes e batata frita. É amigo quando fala da novela e das maldades da antagonista. É amigo para falar a “última” sobre fulano, é amigo para acompanhar ao show de um grupo famoso, é amigo para encontrar na rua e trocar dois ou três beijinhos no rosto e propor um improvável novo encontro.
Mas e quando a gente fica sem dinheiro? Quando amigos estão do teu lado, não necessariamente para te dar uma grana, mas para te dar uma força e uma idéia de como sair do sufoco? Quantos amigos estão do teu lado quando paira no coração aquela dor de cotovelo de tirar o fôlego e parar o ar? Quantos amigos aturam a sua bebedeira insuportável e ainda fazem aquele chazinho de consolo?
Quais dos seus amigos te defendem mesmo quando você está errado? Quais deles te ligam para te desejar um bom dia e saber se depois de ontem você está bem?
Quantos amigos sabem que quando você está de mal humor com o mundo e doido para ficar sozinho, o que precisa mesmo é de um bom colo e um olhar de “eu estou do teu lado”?
Amigo se reconhece, olhos nos olhos ou mesmo “palavras por palavras” em tempos modernos de internet. A gente se assemelha, mesmo sendo totalmente diferente. Amigo a gente sente pelo cheiro. Mesmo quando é tão egoísta, mesmo quando é tão triste, mesmo quando é tão complexo.
Tem amigo que cola que nem bottom no coração. Amigo de verdade já vem tatuado por dentro.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

PESCOÇO


Às vezes me dá uma raiva ao ver a cobertura maciça da imprensa brasileira sobre a presidência dos EUA. Eu entendo a importância mundial de tal escolha, mas meu mau humor oriundo de uma sexta feira de halloowen ainda não passou. Não quero crivar bandeiras nacionalistas no solo gentil da pátria, até porque sou antropofágica demais para isso, mas é estranho demais virar e ver estampado em todos os jornais as fotos e as propostas do candidatos a presidência de outro país. Acabamos de eleger um prefeito, estou mais preocupada com meu mundinho.
É claro que isso é uma visão tola e pequena, mas muitas vezes é tudo isso que precisamos no momento. Saber o que o prefeito eleito vai efetivamente fazer para melhorar a minha rua é imediato alívio. E se haverá escolas, hospitais, creches e se quando eu sair de casa tenho mais chances de voltar sem levar uma bala perdida. O impulso bárbaro de olhar para o próprio umbigo muitas vezes me deixa muito culpada, mas faz parte do capitalismo instituído, cujo maior representante seja o próprio EUA. Eles ditam, não só o Oscar, mas também a economia mundial.
E no meio de toda a contradição entre a minha visão egocêntrica e a mega extensão econômica do assunto, sobre tudo relativo se a crise mundial vai me afetar diretamente, uma situação em especial me comoveu. Quando soube oficialmente, na madrugada do dia 05 de novembro, que o candidato Barak Obama foi o vencedor na super divulgada disputa presidencial dos EUA, não pensei se ele era americano, brasileiro ou qualquer pormenor que deve ser julgado no momento de uma eleição. Tudo ficou insignificante para a importância histórica da vitória deste homem.
Fomos todos acostumados a ver os EUA como um país que não aceita seus negros, nem os latinos e os de origem árabe. Lembro de histórias cruéis e preconceituosas do passado e do presente. Os considerados minorias, foram colocados a margem da sociedade, humilhados com separações e se tornaram cidadãos em eterna rebelião diante de uma sociedade injusta. Porém, tudo isso foi amplamente divulgado pelo cinema norte-americano, mas mostra o que está diante de nosso umbigo também. Afinal, nós brasileiros convictos, somos uma mistura inter-racial, que muitas vezes renegamos nossa cor e descendência, com preconceitos baratos e incoerentes.
Olhei pela tv nos olhos de um homem relativamente jovem, mulato, com um enorme carisma e com o destino marcado para ser um herói, mesmo que faça o pior governo que já se tem noticia. Com mãe branca, pai negro e africano, padrasto indiano e coberto de preconceitos ao longo de sua vida, Obama tem o nome semelhante ao maior inimigo americano, Osama. Um trocadilho de palavras e um deboche a cultura moralista e hipócrita que nos acostumamos a aceitar como ideal e que criaram ídolos como Luther King e Malcom X.
No meio de uma lágrima de emoção, lembrei também da vitória de Lula. Um barbudo com
diploma de segundo grau debaixo do braço, adquirido por um supletivo e que tinha uma verve inebriante, insistiu e acreditou tanto que chegou ao poder enaltecido pelo povo que o elegeu. Foi nossa “Queda da Bastilha”. O povo, enfim, no poder. E como a famosa revolução francesa, apenas os nomes foram alterados e muito do antigo permaneceu. Já não importa mais se o sonho de um governo perfeito ficou apenas no sonho. O símbolo de um homem comum, que não sabe sequer falar a língua dos yankes e ainda assim ascendeu é nobre.
Todo homem precisa de esperança para continuar seguindo. A esperança depositada em Lula foi de um homem que possa entender a língua dos plebeus. A de Osama é que não exista mais distinção de raça, religião ou mesmo sexo para se qualificar uma pessoa. No reino capitalista, egoísta, soberbo, supremo, somos todos frágeis, solitários, inseguros e substancialmente prejudicados pelo nosso próprio preconceito e mediocridade. Alguns ídolos morreram de overdose, ou foram assassinados ou simplesmente caíram no poço da esquecimento ao se tornarem pessoas comuns.
Como foram os ídolos de outrora que morreram de overdose ou foram assassinados ou simplesmente viraram pessoas como todas as outras desprovidas de superioridade, o mundo precisa de alguém que traga esperança, que crie códigos de compreensão, que tenham vínculos com a necessidade mais básica.
A vitória de Obama não foi só de um país, mas da humanidade.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

LEMBREI DE VOCÊ


Encontrei um cara barbado hoje na rua, com bermuda, seus vinte e poucos anos, sorriso largo e roupa desalinhada. Lembrei tanto de você... quinze anos mais novo que eu, sem querer muito da vida além de aventura e o vento. Eu queria tudo e descobri contigo que o vento era o melhor negócio. Adorava andar do teu lado e fazer aquele casal típico do “nada a ver”. As pessoas olhavam, comentavam e acabavam aceitando dizendo “o quanto combinávamos”. É, de fato, a gente combinava mesmo. Nossa conversa seduzia todo mundo para ser meros expectadores, porque a gente não deixava ninguém falar.
Eu gostava de tudo em você, das suas opiniões, seu jeito amalucado, seu olhar caridoso e sensível, sua ingenuidade, seu fogo na cama. Até hoje eu não consigo entender como pude viver tanto tempo sem ter experimentado você. Eu, que deveria te ensinar os caminhos da vida, aprendi contigo que a vida tem caminhos tortos.
Cansei de parar o que estava fazendo porque senti o gosto de tua saliva naquela hora. Um gosto peculiar, açucarado. Eu lambi cada centímetro de sua boca e era realmente muito bom. Não tem mais uma roda de forró que eu não pare para olhar se você está por perto. Com aquele chapéu indefectível, ou o gorro, ou a calça de moletom rasgadinha do lado, com suas danças amalucadas e uma inebriante vontade de aparecer.
Eu me orgulhava de fazer parte de sua vida, de ser motivo de suas canções, de estar na sua dúvida, de te fazer tremer sempre que falava comigo. Acho que você treme até hoje.
Eu lembro de cada nota que você tocou para mim no violão e de sua gargalha desengonçada que assustava as pessoas e me fazia rir. Você sempre quis rebelar o mundo com essa gargalhada e eu estava com você nessa empreitada.
Agora lembro também que eu tinha você nas mãos e deixei cair num sopro. Das três tatuagens que fiz por você, uma delas com teu nome e que não sairam nunca do meu corpo. Como a marca que você deixou dentro de mim, arranhada com sua barba por fazer.
Isso é amor.

domingo, 26 de outubro de 2008

MAIS UM DRINK


Morte é dor infinita. Eu só quero que você agora não exista mais, só para eu não ter que esperar todo dia pelo dia que você vai aparecer. Às vezes tenho uma crise de lucidez e te odeio intensamente. Nessa hora, pegos todos os recortes que me remetem a alguma lembrança e jogo fora. Caminho e vou viver minha vida como se você nunca tivesse existido.
Eu daria todo o meu humor e cortaria o meu cabelo bem curto só para saber o que você está pensando nesse momento. Será que está pensando em mim? Será que no meio de todo o turbilhão de sua vida ainda sobra um espaço para as lembranças de minha existência?
Eu estou muito ocupada nesse momento, remendando meu coração em farrapos. E nem sei costurar, está ficando difícil dar pontos sem nós. O bolo em formato de coração que fiz para você queimou.
Minha vontade agora é sair correndo até ficar sem ar; escrever teu nome repetidas vezes por toda a ponte Rio-Niterói; comprar todas as coisas que eu acho que ficariam bem em você; derramar flores pelo seu caminho; fazer serenatas; escrever todos os poemas e prosas que caibam na sua biblioteca, incluindo todas as palavras do dicionário, cujo sinônimo, invariavelmente, seja o quanto te amo. Ah, comer todos os pastéis de Belém que meu estômago suporte; pegar ônibus para olhar a paisagem e não me sentir culpada porque penso no teu rosto; pular de para-quedas com uma faixa escrita ‘volta para mim”; alugar um carro de som daqueles bem escandalosos, com músicas bregas só para chamar sua atenção. Compor uma canção linda e aprender a tocar violão para te agradar.
Fazer um caminho de velas para te celebrar; rezar novenas pedindo para que você seja a pessoa mais feliz do mundo. Eu queria ter uma escada bem alta para te dar um pedaço da estrela mais brilhante e dizer que é tua alma que a reluz.
Acho que eu seria uma pessoa até melhor se o nosso amor não tivesse se perdido no meio do nada e ficado todo sujo com uma tinta que não quer sair.
E olha que tudo o que eu queria era só andar de mãos dadas com você e viver contente do teu lado.

sábado, 25 de outubro de 2008

GRITO


Eu chego na janela correndo, quero gritar teu nome o mais alto que meus pulmões conseguirem. Quero que ouça meu grito. Quero que me atenda o mais rápido possível.
Preciso de você. Preciso de você com um atraso de pelo menos uns dez anos. Porque está tão atrasado?
Não entende quem sou eu? Vamos fazer um óculos novo, limpar seus ouvidos, retirar os dramas de sua cabeça. Estou aqui, de frente para você, nua e feliz. Não quero nada demais, só você quando puder, enquanto tiver um minuto, um momento para me ter nos seus braços como se não houvesse outro dia.
Saudade de sua canção. Escuto tudo o que me leva até próximas lembranças.
Fecho os olhos, atenta, para ouvir tua voz. Ouço sussurros. Arrepio todo o corpo. Você está cantando para mim, é linda sua música. É nova? Fez para mim? Que lindo... Canta de novo? Ah, eu adoro quando você canta para mim...
Quer que eu te dê minha mão? Claro! Não solta. Promete que vai lutar por mim em qualquer situação? Então eu confio em você. Também lutarei por você sempre. Eu te amo. Ih, esqueci, não posso dizer, é solene. É casto. Quero te abraçar... pode? Me beija? Tua língua, teus lábios delicados e másculos. Me afugentam de mim mesma? Estou dentro de você agora. Não posso mais sair. Me alisa o corpo com tuas mãos de dono. Tem o poder agora, me tens por inteira. Meu sexo é teu. Meu sonho é teu.
Me ocupa em teus projetos. Você se encaixa nos meus, sabia? Sua camisa está amassada, desculpa, acho que fui eu. Tem batom no teu pescoço. Derrubei vinho no meu vestido. Meus pés estão doendo. Acho que tem um naco de sangue na ponta dos dedos. De que você tem medo? Me dá tua mão agora. Você está protegido, vou te proteger até de si mesmo. Não soluça... meu amor, esquece. Ta chovendo lá fora, não podemos sair agora. Coloca teu sexo na minha mão. Você é meu homem e eu sou tua. Tem calor demais aqui dentro. Arde demais no meu peito. Minha garganta ta arranhando. Quero um gole de vodka. Deu zonzeira.
Cala meu grito, diz que tudo é mentira, uma brincadeira de esconde-esconde. Diz que me testa, que morri por nada, que somos felizes, que é tudo de verdade. Que pensa em mim sempre, que sonha comigo toda noite, que não tem nenhuma mulher que se encaixa com você como eu. Diz... cala meu silêncio, lembra de nosso encontro, ria de minhas tolices, compreenda minha ansiedade.
Me cala de frente para a janela. E fecha meu medo de não ter você no meu futuro. Porque não sei mais como se fala amor se não for para você.

UM DIA EU VOU


O dia está tão claro hoje, meu corpo arrepia com o vento surpresa. Coloco a minha blusa laranja ardente, minha saia estampada e uma sandália de dedo e caminho pela calçada, sem pretensão. Meus cabelos soltos e o rosto sem maquiagem indicam meu estado de espírito, livre, leve, solto.
Não quero dogmas, falácias, ignorâncias... quero eu mesma. E só.
AS pedrinhas da rua entram por entre meus dedos e chego a tropeçar, mas não caio. Tenho vontade de sorrir para todos mas vou para a areia da praia buscar a solidão do mar.
Encontro meu aconchego, refugio dos solitários e perdidos em pensamentos e desencontros.
O mar... suas ondas molham meus pés já descalços e me sinto limpa.
Que é isso que eu vejo ali na frente? Um cavalo marinho...Dizem que encontrar um é ter uma vida de viagens. Já me basta viajar dentro de mim mesma, para encontrar o que não sei bem o que procuro.
Meus olhos ardem com o por do sol. Meu corpo escorre um pouco de suor e minha blusa gruda no corpo. Meu cabelo resseca no sal e meu pensamento se desvia com a bola de uma criança.
Não quero pensar em nada.
Sento na ponta da pedra e sinto minha alma flutuar. Talvez um dia eu saiba porque errei tanto. Talvez um dia encontre um fundamento para ter tanto medo de dar mais um passo. Talvez um dia eu encontre o sol dentro de mim.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

NOTIFICAÇÃO


A vida é um dia claro, uma noite de tempestade, uma trégua. Somos da natureza e uma formação do vento. Às vezes, as palavras soam equivocadas e perdemos uma estação. Muitas vezes é o silêncio que perde o sentido.

ELE COMBINA COM MEU VESTIDO


A gente combinou que não era amor. Combinamos agora que você colocou um fim. Combinamos sermos amigos, como se o beijo que você me deu na boca fosse mera amizade. A gente combina tanto que eu até aceito suas combinações estranhas. Eu só não consigo entender porque você é tudo o que eu quero e eu sou tudo o que você quer, mas ainda assim nossas contas não conseguem entender a adição.
Combinamos então sermos amigos. Liguei para todos os meus amigos como você e avisei que estava disponível. E fiz sexo com alguns para me convencer que não estou contigo.
Na primeira oportunidade, aproveitamos um deslize para nos ofender. E procuramos nas entrelinhas, os motivos mais eficazes para justificar o medo. Ainda estou com seu livro nas mãos e as palavras na garganta. Uma lágrima teimosa insiste em cair sobre ele.
Não vou ter você para contar as novidades. Não vou ter você para me incentivar a ser o que sou. Não vou te ter para me colocar dentro de mim como você me coloca. Fecho os olhos para ter medo do escuro e esquecer que tenho é medo de você ir de vez.
Ah, isso é muito mais amor que o amor, querer você por perto e me afastar de você para te ter por perto. Tentar disfarçar o tamanho do meu coração para não assusta-lo, de tão grande que ele está.
Você é insuportavelmente igual a todo mundo, talvez por isso eu te ame tanto. Não faz a menor questão de ter uma diferença, sequer uma necessidade de ser diferente. Tem todos os defeitos do mundo, mas é insuportavelmente melhor que todo mundo.
Combinamos nos desentendermos em todos os momentos que o amor ficou maior que qualquer questão. Mas seus fluidos ainda estão sobre meu corpo e sua camisa cor ocre arde nas minhas vistas. Nem consigo fazer mais poemas porque as palavras não combinam mais entre si. Mudo e reverto os trajetos para esquecer de sua existência impertinente em todas as esquinas que caminho. O seu nome está escrito no meu travesseiro e só durmo de bruços.
Talvez um dia a gente combine que você seja meu dono e que cheire meus cabelos com suspiros profundos, apalpe meu sexo para domina-lo, morda os bicos dos meus seios para engolir minha alma, detenha minha língua para modificar o silêncio, me convença que ama minhas manias mais insuportáveis e que nunca vai enjoar delas, salpique dentro de mim a idéia da perfeição, caia no meu colo depois de uma bebedeira, regule meu decote, sinta ciúmes de meus amigos e de seus amigos quando me olham admirados, se orgulhe da tola que tanto te ama e se sinta o idiota mais feliz do mundo borrado de batom vermelho sangue.
Talvez um dia você possa receber o meu afeto sem limites. E possamos beber de alegria e viço, a surpresa de não saber o que se é.
É, talvez um dia a gente combine que o sexo que desejamos seja o sexo para sempre, ou até que o tesão exista e o amor seja eterno e ainda caiba em nossas combinações. .

REVIRANDO LATAS


Eu fico horas escrevendo milhares de coisas com a esperança que você as receba nas ondas do pensamento. Eu deleto quase tudo depois, porque passa. O amor passa, mas a gente insiste em sentir dor por ele, como se fosse eterno. A gente sabe que nada é eterno. Sabe que vai morrer e que todo amor morre antes. E antes do amor, a gente dá um empurrãozinho na dignidade também.
Eu sou tão passional que me vejo de joelhos aos seus pés pedindo para que volte a ficar nos meus pés. E quando tomo um banho gelado vejo o quanto são ridículas as repetições da insanidade do amor.
Sugiro que todos os apaixonados sejam internados! O amor nos torna absolutamente surreais. Quem lê as minhas linhas de amor, compreende porque preciso de uma camisa de força quando digo “estou apaixonada”.
Sou capaz de escrever músicas, poesias, textos, histórias sobre o mesmo tema: seus olhos. Vai entender o amor? O importante é a licença poética.
Meu telefone não para de tocar e quando toca e não é você, o desanimo me abate. Mesmo sendo a mais maravilhosa noticia, não é a sua voz que está do outro lado da linha.
E como está o meu cabelo? E a maquiagem, ta de enlouquecer?
Ah o amor... que tolice essa história de sentimentos. Perdemos tanto tempo falando dele que não o vivemos de fato.
Estou me tornando uma “guru” do amor corrompido. Se quiser umas aulinhas de loucura, apareça! Minha casa está que é puro incenso. Pode ser que assim você chegue mais rápido ou pegue logo esse telefone e ligue para mim, diga que tudo não passou de uma bobagem e que a gente vai ficar para sempre feliz. Será que essas estátuas que comprei vão servir para alguma coisa?
Eu comecei até a rezar e pedi a Deus que faça o milagre para eu poder acreditar Nele. Quem sabe com a fé as coisas se resolvem mais rápido?
Será que você escuta quando te chamo?
O amor remexe o cérebro e parece que vai cair todas as lembranças que vivi.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

SECULAR


Perdida estou num lugar que nunca estive. Nem sei se estarei um dia. Mas escrevinho palavras incoerentes para desenhar meus sentimentos tortos. Rimo palavras sem eixo, irrito as letras com meu canto. No canto, solfejo soluções e prantos. Me assusto com o que vejo e o que não vejo. Tua alma. Tão opaca que oprime e chego a duvidar que te amei tanto. Ou te amo e amarei em bruma. Rouca de gritos insolentes, solenes sentidos de apego. Me pego pensando em ti em frações de segundos mais rápidos que meu ar. E tua boca curvilínea que me sorri em desalinho e tonteia minhas pernas incoerentes que cismam em caminhar até ti.

Deixarei intacta tua imagem. Fixa imagem de franqueza. Deixarem minhas mãos me guiarem para o mar e a lua que parece tão próxima, mais próxima que tua alma.
Sinto que sou um gesto, que posso te possuir. E que posso me enganar com a lua que parece tão perto e com o mar que parece tão sereno... teus olhos serenos de mar e brilhantes como a lua, me afogam de saudade.

Nem mesmo num lugar onde estive, talvez nem estivesse mesmo lá, presenciei olhos tão silenciosos. No canto deles há uma coisa que me encerra. Estou demasiadamente perto, para ser engolida por eles. Encerram e não ouso mover. Nada que me estenda a esse lugar que nunca estive se iguala ao poder de tua intensa fragilidade. Ou de tua ternura quando respira. A morte se recicla em teu olhar, tão doce e selvagem olhar...
Que pequena sou eu diante de teu mar. Misterioso mar de olhos tristes e perenes. Tão perenes quanto a vida que se espreita e a vontade rouca de te invadir e te amar e ser amado pelo teu olhar.

Te deixarei ir, não sem antes encostar no meu rosto o teu rosto e fazer com que sintas o meu aroma. Talvez você sufoque, talvez você desmaie. Talvez você descubra o meu veneno. Ouvirei tua fala amorosa e teu suspiro seco. Teus olhos para mim, tão fechados e vivos e misteriosos, tão meus que nem sei onde coloca-los.

No fundo do mar, talvez. Na ponta da lua, na curva das estrelas. Na saudade que acena com a mão que teus olhos já me descreveram tantas vezes sem querer...

SINAIS DE FOGO


A vida, irremediavelmente, é um estresse.
Eu tenho uma vontade louca de quebrar o dedo do pai da garotinha, que permite que ela aperte, insistentemente, o botão do sinal de transito, que quebra, porque tem que quebrar mesmo. Um desejo insano de socar o guarda que fez vista grossa para o homem que estava com ódio do que ouviu no telefone (ou do que não ouviu) e quebrou o orelhão inteiro, sem nada ter feito para impedir ou repreender.
Da mulher que leva seu cão para passear e permite que ele faça pelas ruas, todo o coco que poderia caber em seu intestino e não limpa. Das pessoas que andam em zigue-zague e ocupam toda a calçada, impedindo que alguém passe a frente.
Dos carros que fazem questão de passar pelas poças d´água feitas pela chuva ou pelo estouro de algum esgoto, e derramam aquele líquido fétido em cima de uma roupa limpa e saudável. Dos que avançam o sinal e dos outros que param na faixa de pedestre. Sem contar dos que estacionam no meio da calçada e a gente tem que passar pelo meio da rua.
Dos ônibus que não param no ponto quando damos o sinal e quando param, estão a “quilômetros” de distancia e a gente tem que correr a plenos pulmões, porque as vezes eles vão embora quando estamos chegando perto.
Tenho raiva da humanidade quando vejo os pedintes, que usam seus filhos ou alugam os dos outros. Crianças pequenas com o nariz escorrendo de catarro, os pés descalços e nuas pelas calçadas sujas, tudo para comover o tolo passante, que acha que dando uma moeda vai mudar tudo e não percebe que só alimenta a hipocricia.
Não entendo porque o policial aponta uma metralhadora imensa para quem está caminhando pela calçada, carregando mochilas e filhos que chegam da escola. Nem o som estridente da loja de colchões, que quer atrair seu público com um funk assustador.
E o que falar das pessoas que entregam folhetos de divulgação e forçam uma barra enorme para você pegar aquele papel que vai parar na lata de lixo, sem sequer você ter interesse em saber o conteúdo.
Saio do meu corpo de tanta insanidade com alguns comerciantes que te atendem mal, como se fosse uma ousadia de sua parte ir comprar naquela loja. De quando a gente senta para tomar uma cerveja na beira da rua e não consegue engrenar uma conversa sem ser interrompida centenas de vezes pelos vendedores ambulantes, que também não se intimidam em jogar areia em todo o seu corpo quando você está deitada, tentando pegar um sol na praia, em paz.
Da porta do banco que trava quando você tenta entrar, sem absolutamente nada de metal ou coisa parecida e ainda tem que aturar o sorriso de canto de boca do guarda.
Daquela criança irritante que corre pela loja e abre a cortina do provador que você está. E me deixa roxa a vendedora da loja que te aborda na vitrine da loja, já avisando que naquele lugar não tem nada que caiba em você.
Mas talvez o “hour concurs” sejam os idosos. Coitados! Visados pelos preconceitos e impostos a humilhações da sociedade jovem, que não entende sua maturidade e vivência... Usam e abusam de sua arrogância e esqueçam que os direitos são de todos. Tem também as grávidas, os portadores de deficiência e as mães com crianças no colo. A alegria que um idoso tem de reclamar seu lugar na fila com essas pessoas é qualquer nota! Aquelas velhinhas adoráveis, oriundas de histórias infantis, escondem uma vida de virtudes e vícios, esquecidos pelo romantismo dos direitos conquistados. Não tenho nada contra os direitos, mas contra a forma como se utilizam deles.
Ah, essa vida de estresse, com pequenas coisas da necessária convivência humana. Não temos como escapar desse esbarrão no meio da multidão, nem das pequenas irritações e ódios diários.
Depois de ir a rua, queremos morder a primeira pessoa que passa na nossa frente e criamos um campo de batalha por tão pequenas coisas, que até esquecemos o que é. Ódios produzidos pelo mundo moderno, pela fumaça do ar, pela pressa.
Só me resta sonhar com minha casa no campo e a doce angustia de esperar o dia amanhecer.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

SIMPLES QUESTÃO


Não é uma questão de “caralho”, mas também o é. Não é por isso que sofro por ele. Mas também é. Porque o “caralho” dele é lindo e me faz muito bem quando está dentro de mim. Mas não é por isso. Eu sinto sua falta quando estou sozinha e quando estou fazendo alguma coisa. Parece que tudo fica meio sem sentido quando eu sei que não poderei mais ligar para ele e contar a última novidade incrível. É falta do homem que ele é, que me faz sentir a mulher que eu sou. Aquela mulher que muitas vezes a gente esquece de ser por causa do mundo e de si mesma. Esse mundo tão correto de coisas para serem feitas por pessoas corretas. Ele me permitia ser incorreta e me olhava com tanto desejo que tinha lá sua transcedência.
Então eu sinto falta dele, faz parte sentir falta de tudo o que nos faz sorrir e chorar. E do gozo desse homem, de sua boca quente que se abria sem freios para invadir a minha.
Ah, nem penso mais no “caralho” dele e de qualquer outro homem. Porque ele é o próprio bom “caralho”... aquele que não precisa de tamanho nem espessura para fazer bem o “serviço”. Ele é assim, não precisa ser charmoso, nem bonito, nem alto, nem inteligente, nem rico. Basta ser o que é porque é assim que me faz tão feliz.

DESCONFORTO


No meio da mesa de chope, desviou um olhar para o meu decote. Me contou sobre todas as mulheres que tem comido e dos porres que tem tomado. Às vezes se incomodava quando lembrava do meu vestido que mostrava as pernas. Isso te mostrava que eu não era um amigo de futebol, mas a mulher com quem você dividia a vida até mês passado. Comeu com ansiedade a carne seca com aipim que pediu. Não lembrou que eu detesto carne seca. Entre uma garfada e um gole, me chamou de amor e não se tocou disso. Eu percebi, como todos os gestos camuflados e os toques com o polegar que me dava quando estava nervoso. Parecia um encontro derradeiro, mas era apenas mais um como vários que fazemos durante a semana. Às vezes ele acaba na cama, outras vamos embora como se fossemos dois colegas de classe.
Eu já desarrumei a cama algumas vezes só para lembrar que você dormia nela. Me iludia com teu cheiro no meu travesseiro para que eu pudesse levantar e continuar a vida normal. Chorei copiosamente quando lia um poema que você me declamava e lembrava dos nossos porres e noites de violão. Deixo a tábua do vaso levantada para saber que você está presente. Aproveito para fazer aquela comida que você prefere e a saboreio com um nó na garganta porque sei que o tempero está azedo.
O cd que está tocando é o que você deixou por acaso, depois que levou todas as suas coisas, menos a si mesmo. Ele está no “repeat” e soa como um mantra te chamando para ouvi-lo comigo. Queria que você o levasse de vez, mas não tenho coragem e propor esse corte.
Apesar de estar com fome, meu enjôo não passa. Tem um bolo irritante de angustia no meu estomago. Não sou perfeita, não confundo amor com ego.
A porta da sala ainda tem a marca de suas batidas antes de ir embora. E o copo quebrado cortou o meu pé. Duas, três semanas... nem consigo mais lembrar que isso é depressão.
Você bebe tanto que não lembra onde é o banheiro do nosso boteco de sempre. Quando volta, pede um domec. Seus olhos estão vermelhos, a língua enrolada e as mãos cada vez mais próximas do meu corpo. A gente não para de rir na maior parte do tempo. É sempre assim nossos encontros sem compromissos. As mesmas piadas, as mesmas lembranças dos tempos de amor e tropeços, as conclusões idiotas que chegamos quando nos percebemos tão normais e iguais de sempre. As tantas, com o garçon lavando nossos pés com água suja, você quer pagar a conta. Não aceita divisão. Me pega pelo braço, me abraça forte, me dá um beijo de tirar o fôlego, não fala nada, fico tonta com seu álcool e pegamos um táxi.
A noite deve terminar na cama. E a gente não deve terminar nunca mais.

EM SI


Depois de sair da fila do mercado, com sacolas de compras quase rasgando pelo peso e as pernas inchadas pelo calor irritante, ela estava indo para a casa, depois de mais um dia, mais um instante.
Chegou perto dos filhos, que gritavam por todos os motivos que uma criança grita e fez desdém. Guardou as compras, bebeu uma água bem gelada, a ponto de parecer cortar o cérebro e, enfim, tirou os sapatos.
O dia estava terminando, já começava a escurecer. O barulho da televisão começava a incomodar, mais que os gritos das crianças. Deixou todos por lá e se trancou no banheiro. Tirou lentamente cada peça de roupa, como se todas elas fossem um estorvo. Fitou o azulejo com melancolia e assim ficou por uma eternidade. Bateram na porta do banheiro. Não importa. Não dava para ela ouvir mais nada, a não ser o silêncio contagiante de seus olhos mirando os azulejos velhos. Buscava, talvez, seus sonhos perdidos, ou a mocidade que ela nunca teve. Buscava a si mesmo, talvez.
Talvez era a palavra que ela mais usava para se expressar. Ela era o próprio talvez. Defronte ao espelho pequeno e opaco do banheiro, buscou sua identidade, se é que poderia ter uma. Estava imóvel diante do fardo que pairava na imagem.
Dirigiu-se ao chuveiro, abriu lentamente para deixar a água se espalhar. Estava muito quente, tanto que deixava o seu corpo vermelho. Ela suava debaixo do chuveiro quente. Sua coluna era curvada e suas mãos pendentes. Os cabelos sem brilho, sem corte, sem cor. Deixou a água cair até o corpo se anestesiar. Sua mente também. A porta não parava de bater.
Saiu do chuveiro, se secou lentamente, vestiu um vestido velho. Duas crianças entraram correndo porta adentro. Foi até a cozinha, bebeu um copo cheio de água geladíssima, que contrastava abruptamente com o seu banho quente. Não sentiu nada. Ainda estava anestesiada.
Com os olhos marejados, foi para o pomar. Tinha quatro árvores carregadas de frutas. As mangas caíram quase todas e apodreciam no meio do mato. Ela pegou uma dessas mangas e sentiu quase uma cumplicidade. Sentia-se podre no meio do mundo. Apodrecendo sem ninguém para reparar nisso. Uma fruta tão suculenta, madura, saborosa e apodrecendo sem ninguém para aproveitar toda sua beleza que Deus deu. Uma fruta não pode caminhar até alguém para ser devorada. Ela apenas cai e permanece à mercê do tempo. Mas é injusto dizer que ela se perde. Há larvas se alimentando delas, bactérias, formigas, pequenos insetos. Então, chegou a conclusão, nada se perde, sempre tem algo ou alguém para aproveitar essa fruta. Mesmo que sejam os seres que temos nojo.
Isso lhe deu vida. Esse pensamento lhe deu força. Pegou uma manga no pé e a comeu. Nunca tinha comido uma fruta tão gostosa. Lambeu os dedos, lavou o resto de manga que sobrou nas mãos e no rosto, foi para o quarto e colocou um vestido novo. Ela tinha ganhado de aniversário de sua irmã. Achou que nunca teria ocasião para usa-lo. Mas agora era a hora. Ele era florido, vistoso, elegante. Combinava com uma sandália que tentou guardar para não gastar. Estava se sentindo linda. Passou um batom nos lábios carnudos e ressecados, escovou os cabelos e os deixou com um brilho que não tinha. Escolheu um brinco comprido, uma pulseira que combinava com o colorido da estampa do vestido e respirou fundo. Sorriu. Nunca tinha sentido a brisa do mar estando tão longe dele. Mas por esse instante, se sentiu livre e abriu os braços para abarcar o mundo.
Escreveu um bilhete rápido e colocou num envelope roto. Colou com o cuspe. Pegou as crianças, como estavam, e bateu na porta da vizinha solteirona. Pediu que cuidasse deles para ela. Deu um beijo amado em cada e dedicou tudo o que tinha de mais maternal àquele momento. Ficou em silêncio, admirando a cria. O menor, de dois anos, começou a chorar querendo colo. Ela o beijou, abraçou e ele sossegou. Parece ter entendido. Os outros dois apenas se reservaram o olhar de espanto, mas correram para o quintal da casa, que tinha seus atrativos. Então ela agradeceu e fechou a porta da vizinha. Fechou a sua porta de casa. Caminhou pela rua e foi até o final dela. Depois não se avistava mais a mulher, apenas permanecia o seu perfume.
Ao chegar em casa, o marido não encontrou ninguém, apenas um bilhete dentro de um envelope roto.
“Descobri o amor numa manga caída e vou lutar por ele. Cuide das crianças.”

NÃO QUERO SABER DE MAIS NADA




“Foda-se!!” – Cheguei a essa simples frase ao constatar que estou próxima dos quarenta anos e não estou estressada por causa disso. Achei pior fazer 30 anos, parecia aquela fase de transição entre ser jovem e já ser uma mulher que lembra da juventude. Isso é pior. Mas como superei essa fase me sentindo muito mais interessante que antes, agora acredito que chegar aos quarenta, seja uma grande paz.
Será que de repente eu vou ficar com medo de ser uma “paz” muito grande?
Eu sou sensível demais, choro com fim de novela, fim de filme, emails de corrente, fotos escandalosas, as dores dos amigos e até dos amigos dos amigos. Eu já tive vergonha disso. Agora... “foda-se!”
Sou maldosa, ardilosa, manipuladora e escancaradamente eficaz. Sou feliz com pequenas coisas e comovente com pequenos gestos. Coloco um dia uma roupa linda de morrer, um sapato engraxado e altíssimo, cabelos escovados e brilhantes, maquiagem elegante e outro dia estou de tênis, cabelos com um nó atrás, roupas que não combinam e nem mesmo um brilho labial. Acordei assim e pronto. E daí?
Fico irritada quando vejo uma janela aberta e sei que não é apenas uma janela aberta. Vá lá que ninguém veja isso também. Muito pouca coisa que eu vejo, todo mundo vê. Eu surto de vez enquando, gosto de jogar coisas no ar, de falar palavrões, dar gritos de alívio e ficar com cara de louca mesmo, quase do tipo que baba. Adoro causar medo e desconforto nas pessoas, porque é uma forma de demarcar território. Quando ninguém espera, eu sumo. E apareço nas horas mais estaparfúrdias. Não tenho paciência alguma com papos fúteis e detesto ouvir dramalhões. Mas adoro quando escutam os meus.
Um gesto meu salva uma vida, uma palavra estraga outras. Sou impulsiva por natureza e ela não tem nada de morta. Meus instintos são insaciáveis e normalmente chego antes de mim, me atropelando. É como se eu tivesse um tufão dentro de mim mesma que me faz sair do eixo, ficar tonta, ir para o lado oposto e não reparar o estrago que ele fez. Ou, pior, que ele me fez.
Sou daquelas mulheres que podem se apaixonar por uma piada... um cara que sabe contar aquela piada mais sem graça, que quase ninguém ri ou ri para não desagrada-lo e ainda mantém o mesmo charme... é para me deixar de quatro, quase que literalmente. Mas também sou capaz de deixar os homens esperando amargamente dentro de algum carro, quando marcam comigo e eu simplesmente não apareço. Porque também não gosto de dizer não...
Sou capaz de chorar de amor por mais de uma semana e acordar um dia como se nada tivesse acontecido. Para que sofrer de amor se a gente sabe que ele um dia passará? Mas as vezes eu coloco uma música daquelas que lembram a maior das rebordosas e choro, como se quisesse lembrar do que senti para nunca mais passar por isso.
Eu gosto de ficar pelada, mas não acho que tenho corpo para isso. Fico satisfeita em não ser tímida diante dos homens. Sou uma romântica inveterada, mas não lembro mais com quantos homens transei.
Gosto de ser diferente, que tenha gente que me deteste e me inveje. Mas quando sei dessas pessoas fico muito mal. Um amigo me chamou de uma “bussula em campo magnético”, porque tenho uma energia tão grande que fico sem norte.
Sou uma mulher com quase quarenta, com aparência de 30, que às vezes deixa o cabelo branco aparecer só para lembrar que não tem mais quinze anos para ser tão inconseqüente. Mas ele insiste em crescer e me descabelar com o vento. Nessa hora, tudo o que eu quero é um carinho e se for preciso, fico mansa para o resto da maturidade.

NÃO PRECISA EXPLICAR





Essa nossa historia começou há quase dois anos. Nos conhecemos quando eu queria conhecer todos os homens do mundo. E o melhor lugar para isso é na internet. Ele me procurou, marcamos um encontro e ele foi direto. Não parou para chopes e conversas fiadas. Transamos. Ele me deixou em casa e não fez nenhuma promessa. Nem ligou no dia seguinte. Nem no outro. Quando já tinha esquecido desse evento, ele apareceu no msn. Foi direto, queria transar de novo. E se eu fosse uma mulher normal, daria uns bons foras nele e o desconectaria da minha lista de contatos. Mas não hesitei e confirmei o encontro e transamos melhor ainda que da outra vez. No começo fiquei tímida, comecei a pensar, olhava aquele cara mais novo que eu, musculoso, interessante e que eu sabia muito pouco sobre ele. Tive o impulso de não me sentir culpada e querer saber tudo sobre sua vida, para justificar aquele sexo tão sem compromisso. Mas não dava tempo. Um sexo ardente e depois tchau. Não se sabe se haverá um próximo encontro, muito menos quando. Nessas horas, que eu poderia espernear com o romantismo embaixo do braço, sucumbo ao mistério de ter um homem quase invisível.
Já saímos todas as semanas, demoramos meses, ficamos cinco dias seguidos... não tem regras, nem muito assunto, nem explicação, muito menos cobranças. Ele já disse que era meu namorado e impôs uma fidelidade que jamais teríamos. Temos nossas historias, vidas, romances, como todas as pessoas comuns têm. Mas nos esbarramos de vez enquando. Quando ta chovendo, quando ta calor, quando ta de lua cheia... sei lá... isso não importa. É sem culpas, sem traumas.
Ele tem dez anos a menos que eu. Sei que tem um bom emprego, um bom carro, o mesmo time que eu, é aquário e adora malhar. Saber o bairro em que mora e a foto da namorada me fez ganhar intimidade. Seus pelos claros e sua cabeleira se perdendo de uma cabeça bem desenhada, me faz ama-lo infinitamente em todos os momentos que estamos juntos. Mas quando ele vai embora, não lembro mais seu nome.
Nunca nos ligamos, mas temos nossos números. Nunca nos declaramos, porque não precisa. Mas ele gosta de mim, me olha no fundo dos olhos, me faz sua mulher e me sinto plena nos seus braços. Por alguns minutos, parece que estou com o homem da minha vida. Eu sou uma mulher que tem o homem da vida dela em uns minutos e depois esquece dele como se fosse fugaz. Uma paixão sem nomeclaturas.
E será que a paixão é um sentimento constante e rotineiro? Suponho que o nosso encontro proporcione mais paixão do que a maioria dos casais convencionais. Não precisamos de nomeclaturas
O mais interessante é a indumentária que envolve as necessidades. Quando termino com um namorado, quando estou em crise, quando estou subindo nas paredes de abstinência sexual, ele surge no msn e vai direto ao ponto, como uma injeção de adrenalina. Depois de um sexo selvagem no banco de trás do carro, numa bucólica rua do meu bairro, nos despedimos e voltamos aos nossos afazeres, com o rosto mais saudável e o suspiro de alívio de não se preocupar em saber o que é isso.